Produtos que levam o selo dos supermercados custam até 55% menos
que as marcas líderes.
As marcas próprias são mais baratas porque não precisam de
propaganda RIO - A inflação, que chegou a 7,06% só nos oito primeiro meses do
ano, aliada à queda na renda e ao aumento do desemprego, tem levado
consumidores a mudar seus hábitos e o varejo, suas estratégias.
As vendas do comércio caíram 2,4% este ano e nem os alimentos
escaparam: em agosto, os supermercados venderam 4,04% menos do que em igual mês
de 2014.
Nessa equação complicada, em que o comerciante tenta manter as
vendas e as famílias precisam gastar menos, os produtos de marca própria são
uma variável cada vez mais presente em carrinhos e gôndolas dos supermercados,
e com preços até 55,3% mais baixos que as marcas mais conhecidas do mercado.
Pesquisa feita pelo GLOBO em cinco supermercados do Rio de
Janeiro, entre os dias 23 e 28 de setembro, encontrou 34 produtos de marcas
próprias das redes, numa lista de 37 itens, com preços menores que os similares
das marcas líderes indicadas pela consultoria Kantar Worldpanel.
A maior diferença foi observada no vidro de 500 gramas da
maionese Hellmann’s, que custava R$ 5,69 no Extra Maracanã, enquanto a
embalagem com a mesma quantidade da marca própria da rede saía por R$ 2,59,
menos da metade do valor.
Na Barra, economia semelhante podia ser feita na compra do
desengordurante de cozinha 500ml da marca própria do Carrefour, vendido a R$
5,69, ou 53,7% menos que os R$ 12,29 cobrados pelo desengordurante Veja.
SETOR PREVÊ VENDER 15% MAIS NESTE ANO
Estudo da consultoria global Bain & Company indica que os consumidores
estão menos fiéis às marcas em geral. Para Alfredo Pinto, sócio da firma, no
Brasil, isso é reflexo da perda do poder de compra, principalmente entre os
consumidores da classe C.
A Associação Brasileira de Marcas Próprias (Abmapro) espera que
este ano, as vendas do setor cresçam 15% em relação a 2014, quando totalizaram
R$ 10 bilhões.
— Épocas de crise são as que mais favorecem as marcas próprias,
porque o consumidor tem o orçamento apertado, então ele busca produtos com
qualidade e preço menor — avaliou Neide Montesano, presidente da Abmapro.
O presidente da Associação de Supermercados do Estado do Rio de
Janeiro (Asserj), Fábio Rossi de Queiroz, destacou o compromisso dos
varejistas:
— Ao emprestar seu nome a um produto, o supermercado coloca a
credibilidade em xeque. Então, é óbvio que vai querer ofertar algo de
qualidade.
Especialistas em varejo ponderam, no entanto, que a entrada das
marcas próprias na casa dos brasileiros ainda esbarra numa questão cultural, a
associação entre marcas famosas e status.
Segundo Jonathas Rosa, analista de mercado da Nielsen, pesquisas
da consultoria mostram que, apesar de a maioria dos brasileiros acreditar que
as marcas próprias podem ter até mais qualidade que as demais, há o
entendimento de que elas são para quem não pode comprar o produto de nome ou
está com o orçamento curto. E “as pessoas se sentem julgadas por aquilo que
compram”.
MENOS PROPAGANDA
A principal razão de as marcas próprias serem mais baratas é
exatamente não investirem em propaganda, como explica o sócio fundador da
consultoria de varejo e marketing Azo, Marco Quintarelli.
Segundo ele, em média, as marcas próprias têm preços entre 5% e
30% menores que as líderes das categorias:
— Trinta por cento do preço final de um produto é para custear o
investimento em marketing. Se ele não existe, é possível reduzir o preço.
Outro entrave apontado pelos especialistas é acesso restrito, já
que somente as grandes redes têm seus próprios produtos, e o varejo do país é
muito pulverizado em pequenos mercados.
— A troca de marca é a última opção na hora de fazer economia.
Primeiro, o consumidor troca de mercado, depois deixa de comprar alguns
produtos ou compra menor quantidade.
Por último, muda de marca. Em tempos de crise, não tem como se
dar ao luxo de investir em algo que pode não satisfazê-lo — explica Christine
Pereira, diretora comercial da Kantar Worldpanel
No corredor dos supermercados, porém, o preço parece ser o
primeiro critério a ser levado em conta.
— Nunca senti tanto uma crise. Tudo aumentou, menos o salário.
Acabo comprando o que é mais barato — contou a assistente social Leila Argento,
enquanto sua mãe, Laura Galvão, trocava o pacote de arroz da marca líder que já
estava no carrinho pelo marca própria que custava R$ 3,91 menos.
FIDELIZAÇÃO DOS CLIENTES
Suely Alves Hipólito foi outra consumidora que viu nas marcas
próprias uma alternativa para adequar o orçamento :
— Se eu estou com dinheiro, é claro que vou comprar um Omo
(sabão em pó) ou um Neve (papel higiênico), mas, do jeito que anda apertado,
estou tendo de trocar.
Sua nora Vanuza Campos contou já ter tido boas surpresas ao
experimentar:
— Tem muita coisa boa. Arroz e feijão, por exemplo, depois que
experimentei, nunca mais comprei outro.
Já o casal Claudete Teixeira e Alfredo Lopes se mantém fiel a
algumas marcas, principalmente de alimentos com sabor peculiar. Mas não a
todas.
— Arroz, feijão e papel higiênico, trocamos sem problemas —
contou Lopes.
As redes varejistas não revelam suas projeções, mas esperam
resultados positivos para suas marcas este ano. Rafael Bernardi, gerente de
marcas exclusivas do Grupo Pão de Açúcar, diz que há uma maior predisposição
para a troca de marcas em períodos de crise.
No Walmart, o diretor de marcas próprias Gerard Antonius Eysink
explica que elas fidelizam os clientes. O Carrefour informou que os
fornecedores das marcas próprias fazem parte de um grupo seleto e passam por
auditorias para certificar toda a cadeia produtiva.
A marca própria da Cencosud Brasil, administradora do Prezunic,
foi criada ano passado e, segundo a empresa, as vendas cresceram 127% nos
primeiros doze meses.
Daiane Costa
- O Globo. Foto: Ana Branco / Ana Branco.
Jornal O
GLOBO online.
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