MARINA SILVA: “ESTÃO QUERENDO USAR O PALOCCI”.
A ex-senadora diz que a oposição desistiu de investigar o ministro em troca da aprovação do Código Florestal.
As férias de 13 dias em Israel foram canceladas. Em vez de visitar os templos de Jerusalém, como planejara, Marina Silva voltou a frequentar os corredores do Congresso Nacional, onde atuou como senadora por 16 anos.
Seis meses depois de receber quase 20 milhões de votos para a Presidência, Marina tivera até agora atuação política apagada. Dedicara-se a fazer palestras, de onde tira seu sustento. Agora, ressurge como crítica de seu próprio partido e uma das mais aguerridas combatentes na discussão do Código Florestal, cuja votação está prevista para esta semana.
                       ENTREVISTA - MARINA SILVA         
QUEM É
Militante histórica da causa do meio ambiente, tem 53 anos, é acriana, casada, mãe de quatro filhos.
O QUE FEZ 
Foi senadora por 16 anos pelo PT, ministra do Meio Ambiente no governo Lula e candidata à Presidência pelo PV em 2010. Recebeu quase 20 milhões de votos.
ÉPOCA - A senhora sugere que há relação entre a decisão de votar o Código Florestal na terça-feira 24 e a desistência da oposição em convocar Palocci para explicar seu patrimônio no Congresso. É isso?
Marina Silva – Não sei o que determinou essa votação extemporânea sem considerar as propostas da sociedade. Há três coisas colocadas no Congresso em que há tensão entre oposição e governo. Uma é a Medida Provisória da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, que dispensa licitação; a outra é o incentivo para a energia nuclear; e a terceira é a questão do Palocci. Mas não dá para trocar as florestas brasileiras por dispensa de licitação, ou por incentivo à energia nuclear, ou por não esclarecimentos.
A oposição está usando algo que em nenhuma hipótese deve ser aceito.
ÉPOCA - Seu marido foi acusado pelo deputado Aldo Rebelo, relator do Código, de envolvimento com contrabando de madeira do Acre. Como a senhora viu isso?
Marina – Primeiro, com perplexidade. Em seguida, com indignação. Não sei as razões que o levaram a fazer aquelas acusações levianas. Mas pedi que o Ministério Público me investigue. Cada uma das acusações já está devidamente esclarecida em meu site, com documentos, mostrando que meu marido não tem nenhuma relação com as acusações. E o deputado Aldo sabia.
Quando era líder do governo, todas as informações foram passadas para ele. Ele foi leviano para tentar me constranger na discussão do Código Florestal, uma tentativa de me intimidar, de dar uma satisfação aos ruralistas, já que, pela terceira vez, tínhamos conseguido, com o governo e a liderança do PT, adiar a votação. Como ele não poderia ir para cima do (deputado Cândido) Vaccarezza, ou do (deputado) Paulo Teixeira, ou da presidente Dilma, foi para cima de mim.
Ele tinha de escolher alguém para os que queriam algum tipo de sangue. Quiseram fazer comigo o que estão tentando fazer com o ministro Palocci.
ÉPOCA - O que tentam fazer com Palocci?
Marina – Essas intimidações.
ÉPOCA - Ele é vítima de intimidação?
Marina – O processo em relação ao patrimônio dele é outra coisa. Mas estão querendo usar o ministro Palocci. Nada justifica querer pressionar o governo usando esse artifício. Estranhamente, esse assunto entrou na pauta e, em seguida, foi feito um acordo para votar o Código com a garantia da liberação vergonhosa de atividades econômicas dentro da floresta.
ÉPOCA - Aldo Rebelo disse que a senhora pediu ajuda a ele na época das investigações contra seu marido. É verdade?
Marina – Não. Aldo tinha função importante no governo, e eu era ministra do Meio Ambiente. A assessoria parlamentar (do ministério) levou todas as informações necessárias para esclarecê-lo. Depois, falei com ele por telefone. Nunca me esqueço da forma como me despedi: “Você está com as informações, forme seu juízo de valor”. Só pedi para que ele, de posse das informações que tinha, evitasse uma injustiça. Até agora, imaginava que ele tivesse sido convencido. É por isso que fiquei perplexa quando o ouvi fazendo aquelas acusações no Congresso.

ÉPOCA - Há algumas semanas, o presidente de seu partido, José Luiz Penna, a criticou publicamente porque a senhora não havia se posicionado nas discussões do Código Florestal. Seu engajamento no assunto agora é uma resposta?
Marina – É engraçado. Você aparece na imprensa porque você quer ou quando a imprensa quer que você apareça? Em nenhum momento deixei de trabalhar, de telefonar para o ministro Palocci para falar sobre o Código Florestal, de fazer debates.
Não estive ausente. Não vou entrar em discussão com alguém que queira julgar se eu atuei ou não. As pessoas que me conhecem sabem que atuei.
ÉPOCA - O comentário do Penna foi injusto?
Marina – Talvez seja melhor a sociedade avaliar a atuação dele quanto ao Código Florestal – e a minha atuação.
ÉPOCA - É possível levar adiante seu projeto nacional, em um partido que é conduzido por pessoas com quem a senhora tem pouco em comum, como o Penna ou o deputado federal Zequinha Sarney (PV-MA)?
Marina – Na questão ambiental, trabalho ombro a ombro com o deputado Zequinha Sarney. Quanto à visão de política, temos divergências abissais. Não acredito nessa velha política. Os partidos não querem perceber que são o melhor retrato da política que está definhando.
Lamentavelmente, os partidos se tornaram máquinas de disputar o poder pelo poder. Essas dificuldades também existem dentro do PV. A estrutura do PV é verticalizada, não se abre para o diálogo com a sociedade. Duas pessoas mantêm essa estrutura no PV: a secretária de organização, Carla Piranda, e o Penna. Toda essa visão ampla de sustentabilidade se choca com essa pequena burocracia, que ignora representatividade, votos, e se fecha em si mesma.
ÉPOCA - A senhora diz que quer modernizar a política. Mas, pelo jeito, isso não tem sido aplicado nem em seu próprio partido. Seu discurso não perde força?
Marina – Durante a campanha, eu falava da nova forma de fazer política de cabeça erguida, porque achava que o processo de democratização do PV estava em curso. A partir de agora, ou acontece algo que expresse isso no PV, ou não terei mais como fazer esse discurso. Não vou falar de algo para a sociedade que não seja capaz de aplicar em meu partido. Isso não seria coerente. Há um prazo de bom-senso para a mudança acontecer. O PV deve essa satisfação para a sociedade brasileira.
ÉPOCA - Na campanha, a senhora tinha um grupo de apoiadores muito próximo, com intelectuais, o vice Guilherme Leal, o coordenador João Paulo Capobianco. A senhora se distanciou deles?
Marina – As pessoas têm de trabalhar, cuidar da vida. Os que ajudaram na campanha do PV não continuarão contribuindo se o partido não se atualizar. O PV recebeu a contribuição de Ricardo Paes de Barros, Eduardo Gianetti, Neca Setubal, Luiz Eduardo Soares, Beto Ricardo, tantas pessoas.
Terminada a campanha, essas pessoas não quiseram se filiar. O que elas querem é interagir com o partido. Nos termos em que estamos organizados hoje, elas não têm como participar.
Revista ÉPOCA online. Mariana Sanches.





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