A hiperidrose, ou excesso de suor, é um transtorno e só quem sofre com isso sabe como atrapalha a vida. Há quem sue excessivamente nas mãos. Aí fica difícil escrever: a caneta escorrega, gotas de suor molham o papel.
Um simples cumprimento de mãos pode virar constrangimento. O excesso de suor também pode acontecer nas axilas, forçando a pessoa a levar roupas extras para o trabalho, ou então na cabeça ou nos pés.
O tratamento varia de acordo com a quantidade de suor e sua localização. Casos leves melhoram com medidas simples, como uso de cremes à base de sais de alumínio.
Quando a quantidade de suor é grande, a aplicação de toxina botulínica pode ajudar. Ela bloqueia temporariamente a ação da glândula do suor, resolvendo a questão por alguns meses.
Outra opção, definitiva, é a cirurgia torácica. A condução nervosa que chega até as glândulas do suor é interrompida, deixando-as inativas.
O que não existe, até o momento, é um tratamento por via oral satisfatório. Mas essa situação pode mudar. É a conclusão de um estudo realizado na Universidade de São Paulo pelos cirurgiões Dr. José Ribas Milanez de Campos, Dr. Nelson Wolosker e Dr. Paulo Kauffman.
Neste post entrevisto o Dr. José Ribas Milanez de Campos, professor assistente de Cirurgia Torácica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Qual a porcentagem da população brasileira que tem hiperidrose? Não temos estatísticas no Brasil a esse respeito. Mas, baseados em estudos feitos em Israel e nos Estados Unidos, estima-se que aproximadamente 2% da população mundial têm sintomas compatíveis com a hiperidrose. Nessas pessoas, o excesso de suor compromete a qualidade de vida.
Quais os tratamentos tradicionalmente usados? Entre as opções de tratamento clínico temos adstringentes, loções antissépticas e antiperspirantes à base de alumínio, úteis nos casos mais leves.
Outra opção é a toxina botulínica, que tem efeito temporário. E, para um efeito definitivo, principalmente nos casos intensos, é indicada a cirurgia. Existe grande dificuldade no tratamento por via oral. O tratamento, à base de medicamentos chamados anticolinérgicos, tem muitos efeitos colaterais.
Por conta disso, é pouco utilizado. Mas acredito que temos agora um novo panorama com a opção do cloridrato de oxibutinina, droga anticolinérgica usada por nosso grupo.
Como se iniciou o uso desse medicamento no ambulatório de hiperidrose? Em nosso ambulatório para tratamento da hiperidrose, que existe há 11 anos no Hospital das Clínicas de São Paulo, já atendemos aproximadamente 6.000 pacientes.
Operamos mais de 2.100 pessoas, mas dois terços dos nossos pacientes precisavam de outro tipo de tratamento que não o cirúrgico. Baseados em alguns relatos de casos e na experiência de outros ambulatórios que usavam cloridrato de oxibutinina no tratamento de hiperidrose compensatória (uma complicação da cirurgia de hiperidrose), começamos a usar esse mesmo medicamento desde o início do tratamento da sudorese excessiva. Foi uma grata surpresa.
Como é o tratamento?
Após avaliação inicial, verificamos os sintomas e quais doenças poderiam estar relacionadas. Pedimos alguns exames e, se tudo estiver normal, começamos a tratar o suor excessivo com dose baixa, diária e contínua do medicamento, sempre examinando os pacientes a cada quatro semanas e adaptando a dose a cada um deles. Após os primeiros 30 dias já se vê um resultado satisfatório.
Qual é esse resultado?
O que temos observado é que a maioria dos pacientes melhora. Mais da metade deles retorna feliz e satisfeito com o resultado do tratamento. O controle do suor melhora a auto-estima, a qualidade de vida e alivia um sofrimento que aflige nossos pacientes há muito tempo.
Nos pacientes que não melhoram com a medicação e nos que não toleram o remédio, a melhor possibilidade é o tratamento cirúrgico.
Quais são os efeitos colaterais?
O efeito colateral principal é boca seca. Poucos pacientes se queixaram de distensão abdominal, dificuldade para urinar, visão dupla ou sonolência, sintomas que podem ocorrer com doses elevadas desse tipo de medicação.
Em dose baixa, os pacientes se adaptam e quase sempre toleram bem o tratamento. É importante evitar álcool e medicamentos sedativos durante o tratamento.
Existem contra-indicações?
Sim, o grupo de medicamentos anticolinérgicos tem suas contra-indicações, e por isso a indicação deve ser feita sempre por um médico preparado. É contra-indicado, por exemplo, para portadores de glaucoma, mas existem várias outras restrições.
É um estudo inédito?
Todos os que se aventuram a falar que o estudo é inédito acabam cometendo erros. Consideramos nosso estudo um dos primeiros sobre o assunto no Brasil, talvez até no mundo, usando essa medicação nessa dosagem para a finalidade específica do tratamento do suor excessivo.
Temos mais de 500 pacientes envolvidos e a maioria deles está satisfeita. Estamos contentes e continuaremos a estudar até os resultados finais da pesquisa.
O senhor acredita que esse pode se tornar o tratamento preferido para a hiperidrose? Creio que isso pode acontecer. Acredito que esse medicamento usado com cuidado, bem avaliado, em dose baixa, diária e por um período de meses, sempre sob supervisão médica, é um tratamento efetivo para reduzir o suor dos pacientes com sintomas leves ou moderados de hiperidrose.
Nesses casos o controle pode ser parcial ou total. Outra finalidade desse tratamento clínico será a seleção daqueles que realmente necessitam de um tratamento complementar como a cirurgia. Vamos ter mais tempo para decidir. Isso melhora nosso julgamento clínico antes de partirmos para uma solução definitiva, mas sem dúvida mais agressiva, que é a terapia cirúrgica.
Revista VEJA online. Por Lucia Mandel
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