Distantes e, ao mesmo tempo, tão próximas. Ligadas pelas mazelas dos que nasceram e se criaram na periferia. Conectadas pela dor e pelo amor. Marcadas por uma data e um nome: Juan.
Há um mês, em Nova Iguaçu, na Baixada, a babá Rosinéia Maria Moraes, de 31 anos, carregava um cartaz implorando por notícias do filho, desaparecido dois dias antes durante uma ação policial na comunidade Danon.
Em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio, a dona de casa Cláudia dos Reis, de 37, lutava para dar à luz o homem que faltava para completar a família. As mães trilhariam rumos distintos. Os Juans de ambas, também.
Elas não se conhecem mas, em momentos diferentes deste ano, estiveram nas páginas do EXTRA relatando trechos sofridos das próprias vidas. Em abril, Cláudia, então com seis meses de gestação e mãe de três filhas, foi tema de uma matéria sobre o descaso do governo com as gestantes de risco da Zona Oeste.
Dois meses depois, era Rosinéia, mãe de quatro filhos, quem contava a dificuldade para fazer com que a polícia se importasse com o sumiço do seu menino de 11 anos.
Em 21 de junho, Rosinéia registrou na polícia o desaparecimento de Juan Moraes Neves.
— Eu só quero que este sofrimento acabe — revelou ela, no dia seguinte. Foi na mesma data que Cláudia sentiu a bolsa se romper. Ajudada por vizinhos, foi de carona até um hospital a 42 quilômetros de onde mora. Ficou horas com o líquido amniótico escorrendo entre as pernas. Da primeira instituição, acabou sendo encaminhada para outra. E continuou sem atendimento:
Meu sofrimento só estava começando.
Claudia com o filho em frente à casa de dois cômodos da família Foto: Bruno Gonzalez. Ambas não dormiram naquela noite. A cada minuto sem resposta, Rosinéia perdia a esperança de rever o filho. Para Cláudia, a certeza de conhecer o caçula só aumentava com o passar das horas.
No amanhecer de 22 de junho, a babá saiu cedo de casa atrás do filho.
— Quero, pelo menos, o corpo de Juan para enterrar — conformava-se, antecipando o destino do garoto.
Já a dona de casa bateu à porta do hospital mais uma vez, na esperança de poder ter o bebê:
— Não podia esperar mais. Ou meu filho nascia naquele dia ou correria o risco de morrer.
Foi um longo dia para as mães dos Juans. Rosinéia esteve na polícia. Queria ajuda para localizar o menino. Em vão.
Cláudia enfrentou 15 horas de espera sobre uma maca. O Juan dela já havia passado da hora de nascer. Foi preciso uma cesariana.
— Perdi o meu primeiro garoto há 19 anos, quando estava com cinco meses de gestação. Se eu perdesse agora, não poderia ter outro. Era uma gravidez de risco — relata.
Com 49 centímetros e 3,4Kg, Juan Guilherme dos Reis Quintino veio ao mundo às 21h50min daquele 22 de junho. A festa ficou completa cinco dias depois, quando o menino e a mãe voltaram para casa. Ela garante não saber rir, mas escancarou um sorriso ao olhar para o filho.
Para Rosinéia, que hoje está com a família num programa de proteção à testemunha, a dúvida de 22 de junho deu lugar à certeza do fim do seu Juan 15 dias depois: o garoto estava morto.
— Só soube da história desse Juan quando voltei do hospital. Logo pensei na tristeza dessa mãe sem o seu filho, e na minha luta para ter o meu. Não a conheço, mas digo a ela para ter forças. Que nunca perca a fé em Deus e a esperança de um futuro melhor para os outros três filhos dela — recomenda Cláudia, emocionada.
Há um mês, um Juan morreu e restaram três filhos a uma mãe. E, há um mês, outro Juan nasceu e uma mãe ganhou o quarto herdeiro. É a gangorra da vida...
Jornal EXTRA online. Aline Custódio. Claudia dos Reis e seu filho Juan Guilherme dos Reis Quintino Foto: Bruno Gonzalez / Extra

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