A
queda do ministro cuja governanta era paga com nosso dinheiro pode trazer um
bom presságio. Caiu o ministro que nunca deveria ter sido – e o peteleco que o
derrubou foi Doralice, a governanta.
Na
casa grande & senzala do maranhense Pedro Novais, quase tudo parece ser
pago com verba pública: do motel à empregada e ao motorista da mulher. Difícil
saber o que, afinal, o octogenário pagava do próprio bolso.
É
o quarto ministro defenestrado por amoralidades com a verba pública em menos de
nove meses do governo Dilma. É mau ou bom sinal?
Há
quem encare esse número de ministros exonerados como recorde negativo no
Brasil. Prefiro encarar como a primeira depuração real de políticos que
perderam a noção do que significa ocupar um cargo público.
Essa
varredura só é possível num país com imprensa livre. Palocci, Nascimento, Rossi
e agora Novais saíram envoltos em diversos tipos de maracutaias, denunciadas
pela mídia. Eles fazem parte da herança maldita deixada pelo governo Lula. A
ética não vingou nos dois mandatos do presidente que prometeu moralizar a
política.
Como
chefe da Casa Civil, Dilma jamais esteve iludida sobre os malfeitos. Viu vários
companheiros cair em desgraça com o mensalão. Mas era uma subordinada. Hoje,
como presidente, reage às acusações de corrupção na cúpula com mais firmeza que
seu antecessor.
Escândalos
já lhe custaram quatro cargos de confiança. “De confiança” tornou-se, aliás,
uma expressão vazia. Está muito difícil confiar, não é mesmo, Dilma?
Pedro
Novais, no Turismo, era um dos exemplos mais significativos da incompetência
aliada à falta de pudor. Com Sarney como padrinho, era um peralta reincidente e
intocável. Meses antes de se tornar ministro, Novais pediu à Câmara reembolso
de R$ 2 mil por uma festa no motel Caribe, em São Luís.
Aos 80 anos!
Flagrado o deslize, devolveu o dinheiro. E continuou a gastar e desviar.
Aprovou convênios de até R$ 66 milhões para beneficiar os donos do Maranhão.
Fraudes foram descobertas em seu gabinete.
A
queda do ministro cuja governanta era paga com nosso dinheiro pode trazer um
bom presságio.
Mas
foi só com Doralice que a coisa pegou. Era sua governanta havia oito anos e foi
contratada por uma empresa do Ministério do Turismo. Inspirado na música de
João Gilberto, Novais foi visto cantando triste pelos cantos: Doralice eu bem
que te disse/ Olha essa embrulhada em que vou me meter?/ Agora, Doralice, meu
bem/ Como é que nós vamos fazer? Bem que ele tentou se agarrar à saia de Dilma,
mas não adiantou. A presidente decidiu que ou ele saía ou seria saído.
Por
princípio, a queda desses ministros é um bom presságio. Mas quem subiu no lugar
de Novais foi um ministro genérico. Gastão Vieira não é um técnico, não
entende nada de turismo, e suas credenciais são o PMDB, o Maranhão e
Sarney.
Ou
seja, já entra cambaleando. Gastão terá de gastar direito. Sua nomeação
respeitou uma exigência de Dilma que a nós, eleitores, parece surreal. A
presidente disse ao PMDB que o substituto precisava ter “ficha limpa”.
É
encorajador saber que novos ministros não poderão mais apresentar um passado
suspeito. É inacreditável que essa exigência seja verbalizada, como se fosse um
adorno e não uma premissa básica.
Tirando
Nelson Jobim, o gauchão que caiu por falar demais (e mal) do governo, o povo
quer saber o que acontecerá com os ministros exonerados por suspeita de
irregularidades. Nada? Quando Dilma
diz que tomará “medidas cabíveis” contra todos que cometem malfeitos, o que
isso quer dizer?
Eles
só perderão seus cargos, mas permanecerão políticos profissionais em dois ou
três dias de trabalho por semana no Congresso?
Existe
uma crise de confiança na política. Os nomes e as quantias desviadas já não
importam. Sabemos que a punição jamais chega aos mandantes. Novais não passava
de um “trombadinha” dentro de uma política maior e mafiosa.
Dá
vergonha ver a manobra de Sarney e Collor por sigilo eterno nas informações
oficiais no Brasil. O padrinho ao qual Dilma se curva no congresso do PMDB é o
mesmo que a constrange em sua campanha por governos abertos.
Enquanto
a presidente técnica não tiver cacife e autonomia para refundar a política no
Brasil, muitas Doralices serão pagas com nosso dinheiro.
Revista
ÉPOCA online. Ruth de Aquino é colunista
de ÉPOCA. raquino@edglobo.com.br
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