A placenta protege o cérebro do feto, pelo menos em camundongos. É o que mostra uma pesquisa recente publicada por dois pesquisadores britânicos na respeitada revista americana PNAS (Proceeding of the National Academy of Sciences).
A pesquisa feita com 8 fêmeas grávidas mostrou que quando os animais têm restrição de alimentos por 24 horas, a placenta destrói seu próprio tecido reciclando proteínas para não interromper o suprimento de nutrientes fundamentais para o desenvolvimento do hipotálamo do feto.
Essa função “protetora” é surpreendente. Acreditava-se que a placenta só tinha um papel passivo de garantir a passagem de nutrientes da mãe para o feto. O novo estudo mostra que a placenta “sacrifica-se” para proteger o hipotálamo.
A importância do hipotálamo
O hipotálamo é uma região do encéfalo dos mamíferos cuja função é regular alguns processos metabólicos e outras atividades autônomas.
Ele liga o sistema nervoso ao sistema endócrino responsável pela secreção de importantes hormônios como a oxitocina responsável pela produção de leite e instinto materno. Controla também a secreção de hormônios da glândula pituitária — como a gonadotropina.
Os neurônios que secretam gonadotropina são ligados ao sistema límbico, que está envolvido principalmente no controle das emoções e atividade sexual.
O hipotálamo também controla a temperatura corporal, a fome, sede, e os ciclos circadianos. Essas funções vitais mostram porque esse órgão é tão importante e precisa ser protegido.
Conversas “cruzadas” e “em paralelo”
Durante a gravidez os genes do feto regulam a fisiologia e o comportamento materno através da placenta, atuando inclusive no hipotálamo da mãe, ao mesmo tempo que o feto desenvolve seu próprio hipotálamo.
Nessa pesquisa, os cientistas britânicos Broad e Kaverne mostraram que em fêmeas de camundongos muitos dos genes que controlam o desenvolvimento da placenta também controlam o hipotálamo do feto em desenvolvimento durante a gravidez.
Embora os genes estão todos presentes a sua expressão seria como um conjunto de lâmpadas onde algumas permanecem apagadas enquanto outras ficam acesas com maior ou menor intensidade.
E há uma co-expressão entre os genes da placenta e do hipotálamo fetal, como se atuassem em parceria. Esse apagar e acender de lâmpadas ocorre de modo coordenado entre a placenta e o hipotálamo fetal.
O que acontece quando há restrição alimentar?
Os pesquisadores observaram que se há restrição alimentar-isto é, se o animal não recebe alimentos duante 24 horas – a placenta assume um papel ativo para proteger o cérebro do feto.
Por exemplo, os cientistas descobriram que nas fêmeas grávidas submetidas ao jejum, o gene Peg3 -que regula o número de neurônios que produzem oxitocina, um hormônio muito importante para o instinto de maternidade e produção de leite – diminuiu sua expressão na placenta durante a restrição alimentar.
Mas a surpresa é que enquanto diminuía na placenta, acontecia o oposto no hipotálamo do feto. A expressão aumentou. Isto é, isso sugere que com isso o feto fica protegido das consequências da inanição materna.
Quais são as consequências na mãe?
Ainda é uma incógnita. Os pesquisadores não sabem se a inanição afeta seu comportamento ou instinto materno. É importante reforçar que trata-se de observação feita em camundongos.
Não sabemos se esses resultados podem ser extrapolados para seres humanos e certamente não poderemos nunca fazer pesquisas como essas em humanos. Além disso, também não sabemos quais são as consequências se houver uma restrição alimentar prolongada – como ainda ocorre infelizmente em muitas populações. Mas a pesquisa não deixa de ser interessante.
Revista VEJA online. Por Mayana Zatz
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