VIOLÊNCIA ILEGAL.
No Rio, os canhões apontados no alvo do Morro do Alemão contrariam a Constituição. Pela quarta vez consecutiva foi renovado o acordo oficial entre a União, via Ministério da Defesa, e o governo do Rio de Janeiro, prolongando a presença do Exército no indigitado e célebre Morro do Alemão.
Pela quarta vez, também seguidamente, essa decisão sustentada pelo aplauso dos cariocas, assustados pelo poder paralelo dos traficantes, manda às favas a Constituição. E, pela primeira vez, o ministro da Defesa, Celso Amorim, digere o prato feito preparado por Nelson Jobim, antecessor dele na pasta.
A onda de violência que deprime os cariocas vem de longe. E, a partir de então, a população cede aos caprichos dos governantes por essa circunstância.
Anteriormente, nos anos 1960, louvaram, ostensiva ou silenciosamente, a matança de mendigos que amanheciam boiando no fétido Rio da Guarda, na Baixada Fluminense. Posteriormente, sentiram-se seguros quando emergiu no noticiário policial o tristemente famoso Esquadrão da Morte, formado por policiais que expressavam um princípio ainda em vigor: “Bandido bom é bandido morto”.
Mataram muitos: Mineirinho e Cara de Cavalo. Surgiram outros. Hoje em dia, Elias Maluco e Fernandinho Beira-Mar. Mais implacáveis e mais violentos no comando de facções armadas, enfrentam agora os militares e seus canhões.
A presença do Exército no Alemão é a confissão, não oficial, da falência da segurança pública que é uma atividade peculiar de cada estado da federação.
O emprego dos militares na preservação da ordem pública, segundo especialistas, é medida somente recomendável quando houver decretação do estado de defesa ou do estado de sítio. Assim também concluiu o Estado-Maior do Exército no simpósio As Forças Armadas e a Segurança Pública, realizado em maio de 2007.
A atuação das Forças Armadas, na garantia da ordem pública, invadiu a pauta de discussões da reunião do Ministério -Público Militar, em Brasília, entre os dias 9 e 11 de novembro.
O uso do Exército na Garantia da Lei e da Ordem (GLO, no jargão militar) é previsto na Constituição. Nesses casos ela estabelece um ritual: a intervenção federal por meio de decreto do presidente da República, que comunicará o Congresso Nacional em até 24 horas. É o que legalizaria a atuação dos militares no Morro do Alemão.
Através dessa porta arrombada entrou, na semana passada, o despacho da juíza Renata Palheiro Mendes. Ela expediu mandados de busca e apreensão, no Alemão, solicitados pela Força de Pacificação. Os especialistas já condenaram a expedição de mandado de busca domiciliar genérico, como ocorreu nesse caso.
Esse remédio usado no Morro do Alemão não seria usado na zona sul carioca. Além desse flagrante desequilíbrio da lei aplicada no morro e não nos bairros elegantes da cidade, há outra irregularidade percebida na decisão. Pelas regras do convênio entre a União e o governo fluminense, nenhum oficial das Forças Armadas tem atribuição de requerer mandado de busca e apreensão junto ao Judiciário estadual.
Uma ilegalidade sucedeu à outra. E a soma desses dois erros não configura acerto. Ao contrário. São duas flagrantes ilegalidades.
CARTA CAPITAL. | Mauricio Dias. Foto: Domingos Peixoto/Ag. O Globo

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