Outro dia fui dar uma palestra sobre o impacto da
genética nas nossas vidas e acabei falando sobre a nossa pesquisa sobre
envelhecimento: o projeto 80mais. Quando terminei um senhor muito simpático me
perguntou: “E o que devemos comer para envelhecer com saúde?” Comecei a rir.
Infelizmente não tenho uma boa notícia.
Todos os estudos recentes apontam não para o que
comer, mas para deixar de comer, se queremos estender a vida. Já falei disso em
colunas anteriores. Existem várias hipóteses para explicar como a restrição
alimentar pode nos beneficiar e é claro quais seriam as alternativas. Isto é,
viver muito sem passar fome.
Em um trabalho recente, publicado na revista Nature, em maio, cientistas liderados pelo Dr.
David Sabatini, nos Estados Unidos, pesquisaram como a restrição
alimentar atua nas células-tronco do intestino. Segundo os autores, passar fome
, aumentaria o número e ativaria as células-tronco intestinais, pelo
menos em camundongos.
O que os cientistas queriam investigar?
O laboratório coordenado pelo Dr. Sabatini
dedica-se a pesquisas relacionadas com a regulação do crescimento e metabolismo
em mamíferos. Sabemos que os tecidos no corpo são mantidos pelas células-tronco
que têm a capacidade de se auto-renovar e diferenciar-se em tecidos específicos.
Por outro lado, já foi demonstrado, em diversos organismos que a restrição
calórica, preserva a longevidade. Entende-se aqui como restrição calórica, a
diminuição da ingestão de calorias, porém mantendo-se uma nutrição adequada.
Em algumas linhagens de camundongos,
pesquisas anteriores já haviam mostrado que a restrição calórica promove a
formação de novos neurônios e previne a diminuição do número de células-tronco
hematopoéticas com a idade. Na pesquisa que acaba de ser publicada, os autores
quiseram investigar como a restrição calórica atua em células-tronco
intestinais denominadas “Paneth cells”.
O que são Paneth Cells ou células
de Paneth?
Elas constituem as células principais que formam o
“nicho” do epitélio do intestino delgado. Trabalhos anteriores haviam
demonstrado que a perda das células de Paneth (CP) causam
diminuição das células-tronco intestinais (CTI), enquanto a adição das CP
em cultura ( “in vitro”) aumenta o potencial das
CTI. Isto é, aparentemente as CP são “parceiras” importantes para as
células-tronco intestinais.
Como foi feita a pesquisa?
Os camundongos do experimento foram submetidos a
dieta hipocalórica por 4 a 28 semanas e comparados com um grupo controle que
alimentava-se sem restrições. No primeiro grupo houve uma perda de cerca
de 20% na massa corporal. Obervou-se também uma diminuição na massa do
intestino, mas ele manteve-se morfologicamente normal.
Qual foi o resultado observado?
Os cientistas viram que a restrição alimentar
ocasionou a preservação e a auto-renovação das CTI. Observou-se também um
aumento no número tanto das CTI como das CP.
Além disso, a restrição alimentar melhorou a regeneração
do epitélio intestinal. Os cientistas também mostraram, em exprimentos
subsequentes que quando as CTI eram cultivadas junto com CP retiradas de
animais que haviam sido submetidos a restrição alimentar , também ocorria
ativação das células-tronco.
Isto é, como verdadeiras parceiras, as células de
Paneth estavam enviando uma sinalização positiva para as CTI. Algo assim:
“Mexam-se, estamos com pouco alimento”.
Em resumo
Os autores demonstraram aqui , em uma nova
pesquisa, que dieta hipocalórica preserva e aumenta o “pool “de células-tronco
intestinais em camundongos. Essa é mais uma demonstração dos efeitos benéficos
de “fechar a boca” mantendo-se é claro uma nutrição balanceada.
Depois de ler mais esse trabalho decidi que ao
invés de jantar, só vou comer uma frutinha. Pelo menos hoje.
Revista VEJA online. Por Mayana Zatz. Thinkstock.
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