O olhar de Meirelles para 2017
Em entrevista exclusiva à DINHEIRO, o ministro da Fazenda fala sobre os
desafios do ajuste fiscal, descarta um novo Refis e explica como será
concretizada a retomada do crescimento econômico.
Embora
ainda incipiente, o debate em torno da reforma da Previdência Social já causou
um efeito inusitado na rotina do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.
Sua
caixa de e-mails tem recebido algumas mensagens de brasileiros reclamando das
mudanças de regras. Em uma delas, um remetente enviou o seguinte relato: “Eu já
fiz plano durante muito tempo de me aposentar aos 54 anos e agora, com essa
reforma, vou ter de trabalhar mais alguns anos.
Eu não
gosto desta ideia, pois, afinal de contas, não gosto de trabalhar. Eu prefiro
me aposentar e gozar a vida.”
O ministro respondeu com uma indagação: “É mais importante para você ter
a oportunidade de se aposentar um pouco mais cedo e, talvez, receber, ou ter a
certeza de que vai receber a aposentadoria mais tarde?”
Meirelles garante que a questão foi
bem recebida, não gerando réplicas nem tréplicas. Apesar de ainda serem em
pequena quantidade – “até esperava muito mais”, salienta o ministro –, as
reclamações por e-mail sinalizam que a reforma da previdência será a mais
difícil batalha da comunicação do governo Temer, pois envolverá diretamente a
população.
“É assim em qualquer país”, afirma.
As enormes dificuldades não parecem
esmorecer o ministro da Fazenda. Às duas horas da tarde da segunda-feira 7,
quando recebeu a DINHEIRO para uma entrevista em seu gabinete, no 5º andar da
sede da Fazenda, em Brasília, Meirelles esbanjava bom humor.
Naquele instante, a Bolsa de Valores
de São Paulo subia 4% em meio à expectativa mundial da derrota de Donald Trump
na eleição presidencial americana, algo que não se concretizaria no dia
seguinte.
“Um programa de descontinuação das
negociações de abertura comercial é negativo para todo o mundo, inclusive para
os Estados Unidos”, disse Meirelles.
Muito além do clima eleitoral
americano, a recuperação do mercado de ações no Brasil, com valorização de 43%
desde o início do ano, é um termômetro daquilo que a equipe econômica considera
um dos itens fundamentais para a retomada do crescimento do PIB em 2017: a
crença dos investidores no ajuste fiscal.
No cargo há seis meses, o ministro da
Fazenda já obteve importantes vitórias. A repatriação de recursos, por exemplo,
rendeu R$ 35,2 bilhões aos cofres federais.
Deste montante, R$ 6 bilhões já
estavam previstos na execução orçamentária de 2016 e R$ 2,8 bilhões serão
utilizados para cobrir o rombo das empresas estatais neste ano.
Sendo assim, a folga de caixa real é
de R$ 26,4 bilhões, que será destinada, ao menos em parte, para quitar os
chamados restos a pagar – pendências que vieram de anos anteriores. Outro
quinhão servirá para compensar eventual descumprimento do superávit primário
previsto de R$ 6,6 bilhões dos Estados, que estão em situação caótica.
A maior vitória de todas, no entanto,
é no âmbito político. Meirelles tem se esforçado para manter um diálogo
profícuo com os parlamentares a fim de garantir a aprovação do ajuste fiscal.
A Proposta de Emenda à Constituição
241, a chamada PEC dos gastos públicos, já passou na Câmara dos Deputados, em
dois turnos, e foi aprovada, na quarta-feira 9, na Comissão de Constituição de
Justiça (CCJ) do Senado.
No cronograma traçado pela Fazenda, a
tramitação se encerrará na metade de dezembro, quando a PEC será sancionada
pelo presidente Temer.
A partir daí – “um pouco antes ou um
pouco depois”, nas palavras de Meirelles, será dado início à batalha de
comunicação em torno da reforma da previdência.
Alguns pontos já estão definidos:
haverá uma idade mínima de 65 anos para homens e mulheres, uma fórmula de
transição para quem tem 50 ou mais anos, a unificação de regras entre os
servidores públicos e os demais trabalhadores e mudanças nos cálculos das
pensões.
A equipe econômica vai utilizar o
quadro fiscal grave do Estado do Rio de Janeiro como exemplo “didático” sobre a
urgência da reforma.
No início do mês, o governador
fluminense, Luiz Fernando Pezão, lançou um pacote fiscal amargo que, dentre
outras medidas, eleva a contribuição dos servidores públicos de 11% para 14% e
cria uma alíquota temporária de mais 16% para quem ganha acima de R$ 5.189
mensais.
“Não é tirar coelho da cartola”, diz
Pezão. “Agora não tem mais cartola.”
As medidas, que ainda precisam ser
aprovadas pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, estão gerando fortes
críticas e processos no Judiciário. “É um pacote responsável”, afirma
Meirelles.
“Uma coragem do governo de enfrentar
o problema.” Aos governadores que ainda sonham com uma nova ajuda da União, o
ministro da Fazenda rechaça enfaticamente a hipótese e ressalta que “eles
precisam fazer planos de ajuste muito sérios”.
Em discurso a empresários, na
terça-feira 8, em Brasília, o presidente Temer destacou que é preciso por “o
dedo nessa ferida”, ao se referir às mudanças nas regras das aposentadorias.
“Os Estados estão praticamente quebrados, fruto da Previdência Social.”
Em tempos de vacas magras, não há
nenhuma chance de a equipe econômica aprovar uma nova rodada do Refis, o
programa da Receita Federal que parcela e dá descontos em tributos atrasados de
empresas em dificuldade financeira.
Na avaliação de Meirelles, o fato de
os governos anteriores terem criados inúmeros Refis acabou incentivando a
inadimplência.
Outro pleito dos empresários que não
será atendido é a desvalorização forçada do câmbio. Os exportadores temem que o
sucesso econômico do Brasil derrube a cotação do dólar para um patamar inferior
a R$ 3, o que tiraria a competitividade do produto nacional e estimularia a
invasão de mercadorias importadas.
“A solução para o Brasil não é tentar resolver o problema da baixa produtividade
via intervenção no mercado de câmbio, mas, sim, endereçar a questão da baixa
produtividade”, diz Meirelles.
Neste contexto, o ministro tem dado alguns acenos positivos para o setor
produtivo.
O primeiro deles é o compromisso de não elevar a carga tributária num
período recessivo que poderia, inclusive, ter um efeito contrário e acabar
derrubando a arrecadação.
“Nós
devemos ser capazes de resolver o problema fiscal do Brasil sem aumento de
impostos. Ponto”, afirma Meirelles (leia entrevista aqui).
A equipe econômica também vai se esforçar para, em 2017, adotar medidas
que desburocratizem a economia. Para isso, foi criado um grupo de trabalho com
técnicos do Banco Mundial para melhorar o desempenho do Brasil no ranking Ease
of Doing Business.
Atualmente, o País ocupa a 123ª posição num total de 190 países
analisados.
Para aliviar as contas públicas, o governo conta com uma nova rodada do
programa de repatriação de recursos e a devolução de R$ 100 bilhões pelo BNDES
ao Tesouro Nacional.
A
trajetória fiscal benigna, no entanto, só será conquistada com a volta do
crescimento econômico.
As projeções oficiais indicam uma
expansão de 1,6% do PIB no ano que vem, mas há agentes financeiros que projetam
uma retomada mais forte – o Itaú, por exemplo, estima uma alta de 2%.
“A solução para todos está no aumento
da atividade econômica, que vai levar ao aumento da arrecadação”, diz
Meirelles.
No caldeirão do crescimento, estão
sendo adicionados alguns ingredientes fundamentais. Um deles é o Programa de
Parcerias de Investimentos (PPI), que apresentou 34 projetos de concessão em
infraestrutura. Além de ativar o PIB através de obras, o PPI pretende reduzir o
custo logístico do País.
Outro ingrediente é a taxa de juros,
que começou a ser cortada pelo Banco Central. Nesse quesito, o ministro
Meirelles, que foi presidente do BC no governo Lula, não mete a colher.
JUROS MENORES
Mas a avaliação de toda a equipe
econômica, incluindo o presidente do BC, Ilan Goldfajn, é de que o sucesso do
ajuste fiscal é uma das premissas para a redução da Selic, atualmente em 14% ao
ano.
Além disso, a inflação oficial
caminha para o centro da meta (4,5%). Em outubro, o IPCA apresentou alta de
0,26%, a menor variação para o mês desde 2000, segundo balanço do IBGE
divulgado na quarta-feira 9.
REDUÇÃO DO DESEMPREGO
Na análise das principais consultorias
e do próprio ministro da Fazenda, a consequência natural será a redução do
desemprego a partir do segundo semestre de 2017 e, num futuro ainda distante, a
retomada do grau de investimento .
BOA CLASSIFICAÇÃO DAS
AGÊNCIAS
O selo de bom pagador emitido pelas agências
de classificação de risco. Ciente de que a batalha da comunicação pressupõe
muito diálogo, Meirelles está disposto a responder quantas mensagens forem
necessárias. Em tempo: o e-mail do “Pergunte ao ministro”, como ele próprio
definiu esse canal, é henrique.meirelles@fazenda.gov.br.
Comunicação: em seu gabinete, no 5º andar do Ministério da Fazenda, em
Brasília, Henrique Meirelles tem dois monitores e um tablet para receber
informações econômicas e até responder dúvidas da população ( foto: Sergio
Lima)
Confira a entrevista completa com Henrique Meirelles. Na revista ISTOÉ já nas bancas.
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