STF afasta Renan do comando
do Senado: entenda motivos e possíveis implicações para governo Temer.
O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco
Aurélio Mello decidiu afastar Renan Calheiros (PMDB) da Presidência do Senado.
A decisão é provisória e ainda cabe recurso.
O ministro acatou o pedido da Rede Sustentabilidade
que se baseava na decisão do próprio STF que, na semana passada, tornou o
senador réu em um processo de peculato (desvio de recursos públicos).
Ele é acusado de ter usado recurso de seu gabinete
de senador, entre janeiro e julho de 2005, para pagar pensão de uma filha que
teve fora do casamento. A pena para esse crime é de 2 a 12 anos de prisão.
"Defiro a liminar pleiteada. Faço-o para
afastar não do exercício do mandato de senador, outorgado pelo povo alagoano,
mas do cargo de Presidente do Senado o senador Renan Calheiros. Com a urgência
que o caso requer, deem cumprimento, por mandado, sob as penas da Lei, a esta
decisão", diz Marco Aurélio no despacho.
A possibilidade mais provável no momento é que,
após a defesa recorrer, a decisão provisória seja levada ao plenário do Supremo
o mais rápido possível.
O advogado da Rede que entrou com o pedido de
afastamento, Daniel Sarmento, afirmou à BBC Brasil que "não há nenhuma
invenção" na decisão do ministro Marco Aurelio.
"Já há precedentes de decisão liminar quando o
processo está suspenso por pedido de vista", disse ele.
Sarmento se diz otimista com a possibilidade de a
liminar ser mantida, tendo em vista que a maioria do STF já se manifestou no
sentido de que réu em ação penal no Supremo não pode ocupar cargo na linha
sucessória da Presidência - após o impeachment de Dilma Rousseff, a
Vice-Presidência ficou vaga, o que torna o presidente do Senado o terceiro na
fila.
Outro fator que deve contribuir para a manutenção
da liminar, avalia o advogado, é o fato de que já há o precedente do afastamento
do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha.
Segundo o advogado da Rede, Renan só retomará o
cargo se a maioria do STF decidir derrubar a liminar.
Com a saída do peemedebista, quem assume o comando
do Senado é o petista Jorge Vianna, o que pode criar problemas para o governo
Michel Temer.
"Entra o Jorge Vianna e nós vamos pedir para
paralisar a pauta do Senado. Não tem clima para votar a PEC do teto no meio de
uma crise institucional", disse o senador petista Lindbergh Farias.
Em nota, Renan disse que consultaria seus advogados
e que o julgamento pelo STF não foi concluído.
Ação da Rede
A Constituição prevê, no artigo 86, que o
presidente da República deve ser afastado temporariamente de seu cargo se o STF
receber uma denúncia contra ele.
Nesse caso, o presidente fica suspenso de suas
funções por até 180 dias, enquanto responde ao processo.
Com base nisso, um ação movida pela Rede argumentou
ao STF: se o presidente não pode exercer seu cargo caso seja réu no Supremo,
igualmente não poderiam estar na sua linha sucessória outras autoridades que
respondam a processos criminais na mesma corte.
A ação foi apresentada à época como uma tentativa
de retirar Cunha, réu da Lava Jato, do comando da Câmara. No entanto,
solicitava uma decisão ampla do Supremo, estabelecendo uma proibição que
atingiria inclusive futuros postulantes aos cargos da linha sucessória.
Em um julgamento do mérito da ação, no início de
novembro, seis ministros do STF - o que representa a maioria da corte -
decidiram proibir que autoridades que enfrentem processos penais na corte
ocupem cargos na linha sucessória da Presidência da República.
O julgamento, no entanto, foi interrompido porque o
ministro Dias Toffoli pediu vista do processo - ou seja, um prazo maior para
analisá-lo.
Na semana passada, porém, o STF decidiu tornar
Renan réu por oito votos a três, o que motivou o pedido da Rede para que ele
fosse retirado do comando do Senado com base no entendimento já manifestado
pela maioria da corte.
A acusação
© Ag. Senado Eduardo Cunha, Romero Jucá e Renan
Calheiros
Em maio de 2007, uma reportagem da revista
"Veja" afirmou que Calheiros pagava pensão de uma filha que teve fora
do casamento com propina recebida da empreiteira Mendes Júnior.
Em troca, dizia a reportagem, o senador apresentava
emendas (alterações em projetos de lei) que beneficiariam a construtora.
Na época, Renan apresentou ao Conselho de Ética do
Senado recibos de venda de gado em Alagoas para comprovar um ganho de R$ 1,9
milhão, que seria compatível com o pagamento da pensão.
O peemedebista também disse que contraiu
empréstimos para cobrir as despesas de sua filha.
Após investigação, a Procuradoria-Geral da
República concluiu que Renan cometeu crimes de falsidade ideológica e uso de
documento falso para tentar provar a origem de R$ 16,5 mil pagos mensalmente à
jornalista Mônica Veloso entre janeiro de 2004 e dezembro de 2006.
Além disso, entendeu que não houve tais
empréstimos, mas desvios de recursos de seu gabinete de senador (cerca de
metade da verba indenizatória de R$ 12 mil por mês).
O dinheiro desviado teria sido maquiado com o
aluguel de carros, no valor de R$ 44,8 mil, da Costa Dourada Veículos, de
Maceió, para sua atuação parlamentar. Em agosto daquele ano, a empresa
emprestou R$ 178,1 mil ao senador.
Embora a defesa tenha apresentado recibos desse
gasto, não há registro de transação bancária do pagamento. A acusação diz que
as notas são falsas, já a defesa de Renan diz que o pagamento foi feito em
dinheiro.
Em nota emitida após se tornar réu, o senador disse
que "recebeu com tranquilidade a decisão do STF" e reafirmou sua
inocência.
"O debate entre os ministros evidenciou
divisão e dúvidas quanto a consistência dos indícios do Ministério Público,
qualificados como precários por vários deles, inclusive por alguns que
aceitaram a denúncia", ressaltou, citando o fato de alguns ministros terem
considerado a acusação "frágil".
Na nota, o senador disse que "comprovará, como
já comprovou, com documentos periciados, sua inocência quanto a única denúncia
aceita (de crime de peculato)".
"Os serviços foram prestados e pagos em
espécie, o que é legal. O senador lembra que a legislação obriga o Ministério
Público a comprovar (o crime), o que não fez em 9 anos com todos os sigilos
quebrados. A investigação está recheada de falhas", disse ainda.
Renan também é alvo de inquéritos da operação Lava
Jato. Ele nega participação no esquema.
Argumentos pró-Renan
Opositores consideram que a ação da Rede propõe uma
leitura limitada da Constituição.
Chamada a se manifestar na ação inicial, a Câmara,
por meio de seus advogados, sustentou que uma decisão do STF no sentido de
proibir réu de ocupar a presidência da Casa iria contra a os princípios da
separação de Poderes e da presunção da inocência.
Além disso, a Câmara ressaltou que o presidente da
República, enquanto estiver exercendo seu mandato, só pode ser processado por
atos relacionados ao exercício do seu cargo. É o que diz o parágrafo quarto do
artigo 86 da Constituição.
Já no caso dos presidentes da Câmara e do Senado,
nada impede que o Supremo os tornem réus por denúncias de crimes anteriores aos
seus mandatos e sem relação com seu cargo político, por exemplo um suposto
homicídio em um acidente de trânsito.
Dessa forma, dizem os advogados da Câmara na
manifestação ao STF, o presidente da Casa não deveria estar impedido de ocupar
a Presidência da República caso tenha virado réu em um processo sem relação com
exercício dessa função.
Portal
MSN.
Nenhum comentário:
Postar um comentário