Estudo da Unicamp mostra que parte dos pacientes que tiveram
casos leves da Covid-19 ainda relata sintomas persistentes.
Mesmo depois de um mês da fase aguda da Covid-19, parte dos
pacientes que tiveram casos leves ainda relata sintomas persistentes, entre
eles a dor de cabeça frequente, fadiga, sonolência, alteração de memória e
perda de olfato.
Dados preliminares de um estudo em andamento na Unicamp
(Universidade Estadual de Campinas) feito com 80 pessoas que já tiveram a
doença – das quais apenas três precisaram de internação – mostra que cerca de
30% dos recuperados da Covid-19 ainda afirmam sentir fadiga e dor de cabeça
frequente por um período que pode passar de dois meses após o diagnóstico da
doença.
Desses ex-pacientes, aproximadamente 20% relata alteração da
memória e sonolência. Somente 25% dos participantes dizem estar com a
saúde como era antes da infecção.
O estudo, realizado pelo Instituto Brasileiro de Neurociência e
Neurotecnologia (BRAINN) conta com o apoio da Fapesp e a colaboração de um
grupo multidisciplinar composto por neurologistas, psicólogos, enfermeiros,
físico, técnicos de radiologia e biólogos.
Os resultados iniciais apontam para os efeitos do novo
coronavírus no sistema nervoso, desencadeando complicações neurológicas,
segundo a neurologista Clarissa Lin Yasuda, professora na Unicamp que lidera a
pesquisa.
A Covid-19
pode deixar consequências em diversas partes do organismo
A Covid-19 pode deixar consequências em diversas partes do
organismo como pulmão, coração, vasos sanguíneos e rins.
A perda de olfato, sintoma comum durante a doença, também pode
durar por meses, e os especialistas não descartam perda definitiva da
função, ainda que a possibilidade seja baixa.
Como se trata de uma doença nova, não se sabe ao certo por
quanto tempo esses efeitos podem permanecer.
“Não há ainda uma resposta definitiva, mas sabemos que o
Sars-CoV-2 tem mais afinidade para atacar o sistema nervoso central do que os
outros coronavírus conhecidos”, afirma a cientista.
O vírus da
Covid-19 é encontrado no cérebro
Autópsias de pessoas mortas pela Covid-19 comprovam que o vírus
é encontrado no cérebro.
A principal hipótese dos especialistas é que o invasor entra nas
células do sistema nervoso usando o receptor ECA2, ao qual se liga com a
proteína em forma de espinho que possui; o receptor é abundante no sistema
nervoso.
Como as vias respiratórias são a principal entrada do patógeno
no corpo, a proximidade do cérebro facilita a invasão do vírus, segundo Yasuda.
No início de agosto, pesquisadores de instituições chinesas
demonstraram que o cérebro de pessoas recuperadas da Covid-19 teve mudanças
micro-estruturais que podem estar relacionadas ao novo coronavírus.
Os cientistas compararam exames de imagem do cérebro de 60
pessoas que tiveram a Covid-19 com exames de participantes que não tiveram a
doença.
Os resultados foram divulgados na revista científica EClinicalMedicine,
publicado pelo The Lancet, um dos periódicos de maior prestígio na área médica.
Para os pesquisadores, o achado sugere uma relação entre a
infecção pelo Sars-CoV-2, as alterações no cérebro e a persistência de alguns
sintomas.
De acordo com o artigo, os participantes do estudo foram
infectados nos meses de janeiro e fevereiro, mas em maio, quando os exames
foram feitos, cerca de 55% dos ex-pacientes ainda tinham algum sintoma
neurológico.
Para Yasuda, a carga viral encontrada no cérebro pode ser
considerada baixa para justificar todos os sintomas encontrados nos pacientes.
“O mais provável é que esses efeitos sejam fruto da combinação
entre a ação do vírus e a reação inflamatória que ele desencadeia no corpo”,
afirma a neurologista.
As dores de cabeça parecem ser o sintoma persistente mais comum
entre os recuperados da Covid-19
As dores de cabeça parecem ser o sintoma persistente mais comum
entre os recuperados da Covid-19.
Segundo Yasuda, pessoas que já tinham o problema relatam piora,
e pessoas que não tinham as dores com frequência agora sofrem com os episódios
mais numerosos.
Os pesquisadores ainda tentam caracterizar os tipos de cefaleia
nesses ex-pacientes, mas já há relatos de tipos raros, que podem causar até
alterações visuais devido à pressão no nervo óptico. “São manifestações
neurológicas raras que limitam gravemente o paciente”, afirma Yasuda.
Para a neurologista, quando sintomas persistentes são notados é
necessário buscar acompanhamento com um médico para evitar a piora do quadro ou
o abuso de remédios como os analgésicos, que podem agravar as dores de cabeça
crônicas em alguns casos.
Lentidão e
problemas motores são outros sintomas aparentes
De acordo com a cientista, os resultados preliminares da
pesquisa também apontam para o surgimento de lentidão e problemas motores
nessas pessoas. Segundo ela, muitos dos recuperados da Covid-19 podem ter cansaço
acima do normal e, assim, apresentar rendimento menor no trabalho.
“A maioria dessas pessoas deve se recuperar dentro de algum
tempo, mas existe um grupo que ficará com sequelas permanentes”, afirma
Yasuda.
E como mostramos nesta matéria, um estudo indica que a Covid-19
pode causar perda auditiva súbita.
Pacientes mais graves sofrem com maior impacto na qualidade de
vida
As consequências da doença em pacientes mais graves têm impacto
ainda maior para a qualidade de vida.
Um estudo conduzido por pesquisadores de instituições italianas
com 143 pessoas que foram internadas com a Covid-19 mostrou que 55% dos
pacientes ainda tinham três ou mais sintomas persistentes cerca de dois meses
após o período agudo da infecção.
Os sintomas mais comuns foram a fadiga e a dispneia (dificuldade
para respirar).
O artigo com os resultados foi publicado em julho na revista
científica Journal of the American Medical Association.
Até
mesmo crianças podem experimentar efeitos mais duradouros
Mesmo crianças, que geralmente têm sintomas mais leves da
Covid-19 ou são assintomáticas, podem experimentar efeitos mais duradouros.
Uma das consequências mais graves é a síndrome inflamatória
multissistêmica pediátrica (Sim-P), que aparece dias ou semanas após a infecção
pelo Sars-CoV-2 e traz sintomas como febre e dor abdominal. No Brasil, pelo
menos 140 casos da síndrome já foram registrados.
Segundo o infectologista pediátrico Marco Aurélio Sáfadi,
presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade de Pediatria de São
Paulo (SPSP), há casos muito raros de manifestações e consequências mais graves
em crianças no Brasil, como o relato de um caso de hemiplegia (uma paralisia
parcial do rosto causada por derrame) que pode estar ligada à Covid-19.
“Em quadros respiratórios ou urinários mais severos, que precisam
de intubação ou diálise, existe a possibilidade de que fiquem sequelas
respiratórias ou renais”, afirma o médico.
“Mas são casos raríssimos. São poucas as publicações e relatos
anedóticos desses casos em crianças, precisamos de mais tempo para termos uma
ideia mais precisa do que são essas manifestações.
Se fossem mais frequentes já teríamos uma documentação mais
robusta”, conclui Sáfadi.
Conteúdo
FOLHAPRESS;
Imagem:
AltoClassic/iStock.
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