O papel da dor emocional.
Algumas
dores são passageiras, outras tão profundas que parecem engolir a nossa alma e
nos exilar de nós mesmos.
Algumas,
não conseguimos nem nomear. Estão lá, distantes, caladas, atuando nas
entrelinhas do nosso ser. A questão é que ninguém quer sentir dor emocional.
Mas por que ela vira e mexe se mostra presente em nossas vidas?
Este
ano passei por uma experiência muito dolorosa em minha vida. Na tentativa de
ajudar alguém, acabei assumindo uma responsabilidade maior que me cabia, o que
acabou se voltando contra mim.
Foi
um aprendizado difícil, que precisou de muita resiliência para me recompor.
Todavia, esta situação me trouxe muitos aprendizados.
Dor na alma
Após
um confronto desnecessário com a pessoa que tentava ajudar, fui levada para os
porões sombrios de minha alma, com uma sensação de injustiça e impotência que
só me restou me jogar no sofá e num ato de total redenção, me entregar ao
divino.
Eu
não tinha a menor competência para lidar com aquilo. Mas foi esta redenção que
me permitiu vivenciar uma das experiências mais incríveis da minha existência.
Foi
como se minha consciência se desdobrasse e pudesse enxergar tudo do alto com
uma clareza impressionante.
Pude
ver toda a teia que sustentava e que deu origem a tal fato. Meu complexo de
“salvadora do mundo”, que cisma em se travestir de Mulher-Maravilha assumindo
muitas vezes mais do que realmente lhe cabe, ou até mesmo, mais do que está ao
seu alcance.
Minha
necessidade de ser reconhecida, aceita, aprovada.
Esta
experiência foi tão potente que me trouxe um sentimento de plenitude, amor e
compaixão. Quando percebi, estava rindo de tudo agradecendo o ocorrido.
Dor sinaliza o que não está bem
O
fato é que passamos a vida fugindo da dor. A dor do abandono, da perda, do
confronto, da desilusão… E a ironia é que ficamos tão obstinado em fugir da dor
que causamos mais dor. Contudo, a dor também tem seu aspecto positivo.
É
ela que nos sinaliza o que não está indo bem. Seja a nível físico ou emocional,
a dor cumpre um papel importante em nossas vidas, nos redirecionando para
aquilo que nos conforta.
Todavia,
não fomos preparados para sentir dor, apenas orientados para as conquistas e
vitórias que este mundo tão cheio de desafios reserva para nós.
Sem
nos darmos conta de que para alcançarmos tais vitórias, há uma jornada que,
inevitavelmente, consiste em lidar com a dor. Pois crescer dói. Romper a casca
dói. Sair da zona de conforto dói.
Para
evoluir, há que se estar disposto a sentir dor.
Crescer
dói. Romper a casca dói. Sair da zona de conforto dói. Para evoluir, há que se
estar disposto a sentir dor
É
rompendo os tecidos da resistência, que expandimos nossos músculos. No entanto,
dói termos que abrir mão dos nossos apegos e até mesmo, da própria dor.
Uma
vez que as substâncias químicas produzidas pela dor emocional, não apenas
intoxicam nosso corpo como geram dependência química.
Dor e prazer estão
ligados
Ironicamente, dor e prazer estão intrinsecamente
ligados. Quando expostos por um longo tempo a situações dolorosas, criamos
também sinapses neurais que funcionam como verdadeiros programas no cérebro.
E quando nossa energia vital fica atrelada à estas
dores, passamos a vê-las como fontes de prazer. Assim, a Kundalini, energia vital que rege nosso corpo, que além de
se relacionar à sexualidade e despertar espiritual, é também relacionada ao
prazer e à criatividade, faz com que nós mesmos criemos episódios de dor, ainda
que inconscientemente.
“A
dor é uma sombra do prazer”. E luz e sombra, caminham juntas.Não é também por
acaso que nossa sexualidade seja muitas vezes usada como uma válvula de escape
para nossas dores. Levando alguns, inclusive, à compulsão. E o que é uma
compulsão se não a compensação de uma falta?
Seja
como for, fugir da dor emocional só faz aumentar nosso sofrimento. Como dizia
Carlos Drummond: “A dor é inevitável. O sofrimento, opcional.” Quanto mais
resistimos à dor, mais a perpetuamos.
A dor que vem da
não-aceitação
Arrisco
dizer, entretanto, que nosso maior desafio talvez não seja lidar com a dor, mas
com a ‘impermanência’ deste mundo dual. Vida é movimento. Assim, tudo está em
constante movimento e transformação. Nada se mantém inerte.
Nem
mesmo uma pedra se mantém inerte ao passar do tempo. E se estamos sujeitos às
constantes mudanças, se apegar a qualquer coisa que seja, nos causa dor.
Se
existe controle, existe medo. Se existe medo, existe dor. Se existe dor, existe
apego.Se existe apego, existe passado. Se existe passado, onde está você?
Este
desafio de lidar com a dinâmica da vida, acaba nos fazendo oscilar entre
passado – por não aceitarmos determinadas dores, e futuro – por medo de repetir
tais dores do passado, não nos permitindo assim, viver plenamente o momento
presente.
Com
isto, vivemos muitas vezes sob a perspectiva da dor, arrastando as correntes da
não-aceitação.
É
preciso esvaziar nosso “corpo de dor”, as memórias emocionais de dor
armazenadas em nosso sistema. E isto significa olhar de frente para estas
dores:
Quais mensagens essas dores trazem?
O que elas estão sustentando ou por quais crenças estão sendo
sustentadas?
·
Quem está por detrás destas dores?
Como identificar o
que está por trás da dor emocional?
Uma
das formas de identificar suas dores é acessando sua “criança-ferida”. Todos
nós carregamos uma criança em nosso interior. É ela quem mantém nossa chama de
vida acesa, nosso entusiasmo, alegria, curiosidade, espontaneidade, leveza,
inocência…
No
entanto, esta criança também carrega memórias dolorosas em seu sistema,
provenientes de experiências de desamor, como: rejeição, exclusão e abandono.
Quanto
maior a dor dessa criança ferida, maior será também nossa identificação com a
persona da “vítima”. Pois de fato, a criança é vítima das circunstâncias.
Sem
recursos, referências ou autonomia, a criança está totalmente vulnerável ao
ambiente que a cerca. De bracinhos estendidos para cima, ela espera que alguém
a alimente, a asseie, a coloque para dormir e, sobretudo, a ame.
Acontece
que seus pais ou cuidadores, nem sempre estão disponíveis, e muito
provavelmente, também carregam uma criança ferida dentro, o que tampouco e
muito provavelmente, não permitirá que estejam totalmente disponíveis a nível
emocional.
Esta
falta vai criando verdadeiros buracos na alma que faz com que passemos a vida
tentando preencher este vazio, projetando no mundo os nossos pais.Para
sobreviver, esta mesma criança, vai se fechando em si mesma, e desenvolve um
ego que acaba servindo como um guardião da nossa verdadeira essência.
O
ego é constituído de dor, ele vive sob a ótica da separação, que gera medo,
insegurança e mais dor.
Quando
fechamos os braços para nos proteger da dor, também não podemos receber as
bênçãos que a vida nos reserva em sua plenitude.
Podemos medir nossa maturidade pelo
nível de autorresponsabilidade
Mas chega um momento em que
precisamos nos responsabilizar por esta criança. Oferecer a ela todo o
acolhimento e amparo que por tanto esperamos receber.
Caso contrário, continuaremos a agir
a partir das necessidades desta criança. Esperando de fora aquilo que já
possuímos dentro. Pois todo o amor que buscamos já está dentro de nós. Basta
termos a coragem de mergulhar em nosso próprio interior.
É
necessário ter coragem de abrir o quarto escuro da alma para que possamos
encontrar os tesouros cobertos pelos escombros de nossas dores. É lá que
encontraremos nossos maiores tesouros. Sua história é o seu baú de tesouros.
Você não é a sua
dor
Você
não é a sua dor. Paradoxalmente, se desejamos alçar voos mais altos, é preciso
abrir mão da identificação com nossa própria história. Pois tampouco somos a
nossa história. Mas isto só é possível, quando começamos a integrar seus
conteúdos. Estamos aqui para experienciar a vida.
Tudo
por fim se resume a experiências. Se resistimos às ondulações da impermanência,
causaremos dor não apenas para nós, mas para quem estiver ao nosso lado.
Segundo Osho, não é possível experienciar uma alegria genuína
sem viver suas dores de forma genuína.
A
dor nos traz profundidade. Permite que alcancemos nossas profundezas. E com
raízes mais profundas, podemos crescer em direção aos céus.
A
dor também nos humaniza, gera empatia, compaixão. Diminuindo a distância entre
nós e o “outro”. Vale também dizer que o amor que não damos também nos machuca.
Intoxica nosso corpo e não permite que a vida flua livremente.
O corpo fala o que a alma grita. Na prática do yoga
dizemos muitas vezes: “respire na dor”. Pois quando respiramos na dor, ela se
desfaz, expandimos nossa flexibilidade e alcançamos maior presença. E na
presença a vida volta a fluir novamente.
A
dor é por fim, um agente alquímico capaz de proporcionar verdadeiros saltos de
consciência. Assim, investigue suas dores. Tenha a coragem de ir além delas e
encontrará grandes tesouros reservados única e exclusivamente para você.
© Istockphoto.
Portal MSN.
https://www.msn.com/pt-br/estilo-de-vida/lifestylegeneral/o-papel-da-dor-emocional/ar-BBPnxGJ?ocid=spartandhp